Campanha mobiliza a população contra o racismo no SUS

Ação do Ministério da Saúde e Secretaria de Direitos Humanos tem início no mês da Consciência Negra e marca os dez anos da Política de Saúde da População Negra

O governo federal coloca no ar a primeira campanha publicitária que busca envolver usuários e profissionais da rede pública de saúde na luta contra o racismo. Lançada nesta terça-feira (25) pelo Ministério da Saúde e Secretaria de Direitos Humanos, a ação visa conscientizar a população de que a discriminação racial também se manifesta na saúde.

O ministro da Saúde, Arthur Chioro, afirmou que a campanha tem como objetivo o enfrentamento da racismo institucional e o reforço à Política Integral de Saúde da População Negra. “Não podemos tolerar nenhuma forma de racismo. Essa campanha é um alerta para os profissionais de saúde e para toda a sociedade brasileira. A desigualdade e preconceito produzem mais doença, mais morte e mais sofrimento. Nós queremos construir um país de todos e a maneira mais importante é falar sobre a desigualdade”, disse. O ministro ressaltou que o racismo se manifesta, muitas vezes, “em uma negativa do acesso, da informação adequada, e do cuidado”, disse.

Com o slogan Racismo faz mal à saúde. Denuncie!, as peças que serão veiculadas na TV, rádio, impresso e redes sociais incentivam as pessoas a não se calarem diante de atos de discriminação no Sistema Único de Saúde (SUS). Por meio do Disque Saúde 136 é possível denunciar qualquer situação de racismo ou obter informações sobre doenças mais comuns entre a população negra e que exigem um maior acompanhamento.

É o caso do diabetes mellitus (tipo II), cuja taxa de mortalidade, a cada 100 mil habitantes, afeta na população negra 34,1 habitantes, na população parda atinge 29,1 e, entre a branca, 22,7. A anemia falciforme, doença grave que deve ser diagnosticada precocemente por meio do teste do pezinho, é encontrada em maior escala entre a população negra, com incidência que varia de 6% a 10%, enquanto no conjunto da população oscila entre 2% e 6%.

Durante o lançamento da campanha, a ministra de Direitos Humanos, Ideli Salvatti, destacou os avanços da população negra. “Pela primeira vez a população negra e parda se autodeclara como sendo maioria no Brasil. Isso não é porque os negros e pardos se multiplicaram, é porque houve uma condição econômica, política e social de se reconhecerem assim”, afirmou a ministra. Ela salientou que “a promoção da campanha no SUS, e cada vez mais ampliar as políticas públicas dando igualdade de oportunidades a todos os brasileiros, independente da sua raça ou condição econômica, é uma questão central da democracia brasileira”.

Já o secretário de Gestão Estratégica e Participativa do Ministério da Saúde, André Bonifácio, ressaltou a importância da campanha para estimular a discussão sobre o preconceito e a desigualdade. “Não é o SUS que é racista. O SUS expressa uma realidade produzida pela própria sociedade. E o racismo e a discriminação também são uma realidade social que se reflete na saúde.”

A criação da campanha foi motivada por relatos de discriminação e números que revelam a expressão do racismo no SUS, consequências do contexto social e histórico da população negra no Brasil. Dados do Ministério da Saúde demonstram que uma mulher negra recebe menos tempo de atendimento médico do que uma mulher branca. Enquanto 46,2% das mulheres brancas tiveram acompanhantes no parto, apenas 27% das negras utilizaram esse direito. Também 77,7% das mulheres brancas foram orientadas para a importância do aleitamento materno e apenas 62,5% das mulheres negras receberam essa informação.

As taxas de mortalidade materna e infantil na população negra são muito acima das registradas entre mulheres e crianças brancas. Dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) do Ministério da Saúde revelam que 60% das mortes maternas ocorrem entre mulheres negras e 34% entre as brancas. E, na primeira semana de vida, acontecem, em maioria, entre crianças negras (47% dos casos). Entre as brancas, representam 36%.

A secretária de Políticas para Ações Afirmativas da Secretaria de Políticas de Promoção de Igualdade Racial da Presidência da República (Seppir), Angela Nascimento, reconhece os avanços que têm permitido a inclusão da população negra, mas destacou que ainda há desafios a serem superados. “O tema racismo ainda encontra resistência nas nossas formações. Por isso, a campanha lançada hoje representa um passo importante enquanto compromisso institucional e o nosso desejo de construirmos juntos novas práticas”, complementou.

Além de divulgação da campanha publicitária em todas as mídias, será distribuído ainda folders para a população, que trazem números relacionados às mulheres e às crianças negras, além de informar sobre as doenças mais comuns na população negra.

Movimentos sociais

A importância do protagonismo dos movimentos sociais na construção da Política Integral de Saúde da População Negra também foi lembrado durante todo evento. A começar pela cerimônia de saudação a ancestralidade negra conduzida por representantes de comunidades de matriz africana, Tata Inkc Francisco e as yaloraixas Mãe Dora D’Yoá e Mãe Baiana D’Yoá, que abriu o evento antecedendo o pronunciamentos dos representantes do governo.

“Esse é um momento de extrema importância para o nosso povo. Esse é um grande casamento, uma das melhores parcerias entre nós das religiões de matriz africana e o SUS. Mas é preciso que o SUS continue abrindo suas portas para nós, povo de terreiro, que também contribuímos com a saúde e que ajudamos cidadãos que sofrem e adoecem por conta do racismo”, destacou Adna Santos, “Mãe Baiana D’Yoá”, que também é a coordenadora no DF da Rede Nacional de Religiões Afro-Brasileiras e Saúde (Renafro).

Representando os movimentos negros que estiveram presentes no lançamento, Maria Zenó Soares, da Federação Nacional das Associações de Pessoas com Doença Falciforme (Fenafal), destacou a importância da campanha para conscientização sobre o racismo na saúde. “É muito bom saber que por meio dessa campanha as pessoas poderão mudar seu conceito e seu olhar sobre o racismo, que muitas vezes não é percebido ou nominado como tal, mesmo por aqueles que sofrem essa discriminação.”

Novas ações

Profissionais do Disque Saúde já passaram por treinamento para identificar as denúncias caracterizadas como racismo, que serão direcionadas aos órgãos competentes. O racismo não se apresenta necessariamente na forma de atitudes discriminatórias explícitas. Nas instituições pode ocorrer na forma de linguagem codificada (violência simbólica) e negligência (indiferença diante da necessidade). As dúvidas e denúncias registradas no Disque 136 também serão consolidadas e servirão para direcionar novas ações do Ministério da Saúde e da Secretaria de Direitos Humanos.

O Ministério da Saúde iniciou ainda duas novas ações para reforçar o combate ao racismo no SUS. Mais de 2,4 mil profissionais de saúde estão inscritos em módulo virtual de educação à distância sobre a ‘Saúde Integral da População Negra’, lançado em 22 de outubro. E em iniciativa conjunta com o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), após a publicação de edital, recebeu cerca de 100 projetos de pesquisa científica, tecnológica e de inovação voltados para Saúde da População Negra no Brasil.

Política Nacional

O Ministério da Saúde firmou compromisso para a construção da equidade racial em saúde para a população negra ao instituir, pela Portaria 992/2009, a Política Nacional de Saúde Integral para a População Negra, cuja marca é: “reconhecimento do racismo, das desigualdades étnico-raciais e do racismo institucional como determinantes sociais e condições de saúde, com vistas à promoção da equidade em saúde”. O principal objetivo da Política, que é transversal às outras políticas, como Saúde da Mulher, Saúde da Criança, Saúde do Homem, é promover a saúde integral da população negra.

O tratamento pelo SUS de doenças que mais afetam a população negra, como é o caso da anemia falciforme, alcança cerca de 40 mil pessoas. O atendimento inclui exames de rotina, entre os quais, a eletroforese de hemoglobina, o dopller transcraniano para prevenção do derrame cerebral e de sangue para controle da doença. Os medicamentos disponíveis são hidroxiuréia, ácido fólico, quelantes de ferro, analgésicos, anti-inflamatórios, antibióticos e vacinas de rotina e especiais. A cada ano, aproximadamente 2,4 milhões de recém-nascidos fazem o exame de Doença Falciforme pelo SUS, ou seja, uma cobertura de 83,2% das crianças que nascem no país.

No caso do diabetes, a população tem acesso a ações de prevenção e tratamento, desde a atenção básica até procedimentos de média de alta complexidade. São asseguradas gratuitamente as insulinas humana NPH – suspensão injetável 1 e humana regular, além de três medicamentos que ajudam a controlar o índice de glicose no sangue (libenclamida, cloridrato de metformina e glicazida).

As comunidades quilombolas são priorizadas no Mais Médicos do Ministério da Saúde, recebendo investimentos em infraestrutura e profissionais para atuarem nessas localidades. São 249 municípios com comunidades quilombolas atendidos pelo programa, que possuem um ou mais médicos, somando 1.630 ao todo.

Fonte: Ministério da Saúde

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